Quando o churn é realmente um problema para o SaaS?
E quando faz sentido "ignorar" o churn e meter o pé no acelerador?
Olá, seja muito bem vindo(a) à Newsletter Operando um SaaS. Meu nome é Thiago Fagundes e se essa é sua primeira vez por aqui, esse é um espaço onde falo sobre operações de negócios de software como serviço. Inscreva-se para receber nossos conteúdos duas vezes por semana, todas segundas e quintas-feiras. Vamos ao conteúdo!
Essa semana tive um papo com um amigo que tem um SaaS bastante próspero e ele compartilhou comigo preocupações sobre o churn do negócio dele. Ele considerava um número alto, mas não sabia ao certo se estava avaliando da forma correta e se deveria realmente se preocupar. Esse papo me inspirou a escrever esta edição da Newsletter.
Várias vezes falamos aqui sobre a importância do churn e como ele pode ser um fator que atrapalha muito o crescimento de um SaaS. Mas, será que há momentos onde o empreendedor ou gestor pode "fechar os olhos” para o churn e meter o pé no acelerador? Eu particularmente acredito que sim. Mas em casos muito específicos.
É sobre isso que vamos falar na edição de hoje da Newsletter Operando um SaaS.
Antes de mais nada, cuidado com benchmarks
Um dos primeiros problemas em avaliar o próprio churn é entender qual “deveria” ser o churn do negócio e qual um patamar de perda de clientes realmente problemático.
Em nossa conversa, meu amigo me falou:
“Quando eu procuro benchmarks ou vejo entrevistas e conteúdos sobre outro SaaS, me deparo com números que são muito diferentes da minha realidade, algo inatingível hoje.”
Outra reclamação dele foi:
“Parece que as métricas são todas faladas são todas pensadas no mundo de empresas VC-backed (que recebem investimentos externos)”
E essa é uma grande verdade. A maioria dos conteúdos que encontramos sobre SaaS consideram negócios que recebem investimento externo, até porque a maioria dos números de benchmarks são divulgados pelos próprios fundos ou para eles (para que eles saibam quais são as referências para seus futuros investimentos).
Um exemplo de benchmark encontrado por ai é este acima. Foi literalmente o primeiro que eu encontrei no Google.
O patamar de churn é 13% ao ano na mediana. Isso significa um churn ao mês de 1,02%. É nessa hora que o empreendedor se descabela e acha que tudo no seu negócio está errado.
Mas note que:
A pesquisa é americana;
Ela é feita com uma amostragem pequena, de 79 empresas;
Ela é conduzida por um fundo de investimentos com empresas do seu portfólio;
Ela não discrimina mercado, nicho ou produto;
Esse tipo de detalhe é importante observar. No texto do artigo, a Vitally cita patamares de churn mais realistas. Ela fala que a média em 2020 era de 4,8% mensais e subiram para “alarmantes” 7,8% em outubro de 2021.
Mas, na realidade, 7,8% é um patamar excelente para negócios de micro-SaaS, por exemplo.
Então você, como empreendedor de um SaaS pequeno ou médio, deveria ter muito cuidado com esses referenciais.
Quatro pontos que fazem as “histórias” por aí muito diferentes da sua realidade são:
Podcasts, entrevistas e artigos sobre empresas na internet não contam toda a verdade: sempre tem um detalhe da operação que passa batido ou algum problema por trás do número que não é mencionado. Quase ninguém vai a público falar dos problemas que seu negócio passa.
O mundo de bootstrap é completamente diferente: não dá para comparar métricas e estratégias de empresas bootstrap (financiadas com dinheiro dos próprios sócios ou dos próprios clientes) com empresas que recebem investimento.
Mercado e público: mercado e público influenciam muito no churn. A maior parte dos empreendedores de micro-SaaS ou SaaS pequenos vende para públicos com um churn naturalmente muito maior do que um público Enterprise, por exemplo. Pegar referências gringas nesse sentido dá uma visão ainda mais distorcida, afinal o brasileiro é muito mais sensível a preço e muito menos maduro à subscrições.
Produto: existem produtos que têm, naturalmente um churn menor, por gerarem dependência operacional. Um exemplo disso é um ERP. Uma vez que uma empresa implanta um ERP, ela dificilmente troca. Pelo simples motivo de que é um terror trocar, e não pela qualidade do produto.
Os patamares de benchmark de churn, por exemplo, são definidos porque influenciam na escala e no valor da empresa. Então, para startups que pretendem dominar um mercado e subir valor para uma próxima rodada de investimento ou uma eventual venda, o churn precisa ser baixo mesmo.
Mas talvez, no seu caso ou no seu momento, não precise.
Fatores que fazem o churn menos preocupante
Antes de mais nada, você como empreendedor ou gestor precisa entender o objetivo que você tem com seu negócio. Se você tem um lifestyle business (negócio criado para ofertar um bom estilo de vida para os fundadores e funcionários, sem necessariamente um crescimento exponencial), por exemplo, a forma como você olha para o churn é completamente diferente de uma startup.
No fim das contas, se você tem um lifestyle business e sua margem é positiva e suficiente para seus objetivos de vida, você tem um negócio próspero sim.
Não se balize pelo quê o “mercado” diz que é o correto. Muitas vezes, quem está definindo essas regras tem uma empresa deficitária e que possivelmente nem vá muito longe.
Mas, tem 6 fatores que fazem com que eu considere o churn uma ameaça ou não:
Objetivo com o negócio: se você não quer construir uma empresa de crescimento exponencial, e só quer ter uma empresa lucrativa e próspera, a preocupação com o churn é menor;
Tamanho do nicho ou do mercado: se você tem um mercado grande, que não irá se esgotar facilmente (principalmente em comparação com sua base de clientes), você dificilmente irá “saturar” seu mercado com sua oferta;
Taxa de renovação do mercado: se seu mercado cresce a uma boa taxa anual ou tem uma elevada taxa de mortalidade e natalidade de empresas no segmento que você atende, significa que sempre terão novas empresas chegando para você atender;
CAC baixo: se você consegue adquirir clientes de forma barata, principalmente em volume, e consegue manter uma relação LTV/CAC positiva, você não deveria se preocupar tanto.
Baixo custo operacional: se você conseguir atender os clientes que saem rapidamente com baixo custo operacional, esqueça o churn deles. Ou seja, se esse cliente chega por um canal de aquisição barato, compra por um checkout, não tem processo de implantação 1-1, não tem atendimento de CS e tem um suporte barato - via central de ajuda ou coisa do tipo - nem esquente para o churn.
Momento do negócio: se você está escalando e ainda está encontrando o melhor público para o seu produto, ainda entendendo sua estratégia para o longo prazo, é natural que você venda para públicos “menos qualificados” e entenda como ajustar isso mais adiante. O importante é não se deixar seduzir pelo crescimento de receita e em algum momento olhar para isso de forma estratégica.
Meu conselho pessoal para ele - e para você:
No fim das contas o que eu disse para ele foi:
Eu não me preocuparia com esse churn geral. Você atende um público muito abrangente e um mercado grande.
Caso você queira crescer muito no futuro, encontre um perfil de clientes dentro desse grande leque que seja lucrativo e sustentável e garanta que essa base de clientes cresça com churn controlado.
Olhe mais para o MRR churn (receita perdida) do que para o logo churn (número de clientes) ou churn rate (taxa de perda).
Encontre formas de ampliar a receita desses clientes, seja via upsell ou outros modelos de cobrança ou produtos, assim seu NRR vai ser positivo e seu churn negativo. Isso que importa para valuation.
O restante dos clientes - o grupo que tem churn muito elevado -, eu garantiria que estão entrando barato e saindo barato. Reduza ao máximo os custos operacionais com eles. Restrinja comercial, implantação, CS e suporte. Torne a jornada totalmente autoguiada.
Fora isso, mete o pé no acelerador. Você tem um negócio incrível.
No fim das contas, um conselho final que eu deixo é o seguinte: o que diz se uma empresa de SaaS é bem sucedida ou não é o retorno que ela traz para seus sócios em patrimônio, dividendo e/ou pró-labore.
Vou repetir o que disse anteriormente e orientar que você não se guie tanto pelas métricas e regras que o “mercado” definiu, e nunca se esqueça:
Não compare o seu bastidor com o palco de alguém.
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