O que é Customer Success e quando você deve ter uma área de CS no seu SaaS?
Quando vale a pena ou não contratar uma pessoa para cuidar da sua carteira de clientes
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Alguns de vocês devem saber que eu trabalho em uma grande empresa de tecnologia do mercado imobiliário, chamada Superlógica. Eu entrei na empresa em 2022, vindo de 5 anos na Stone e assumi um dos times de CS. Pulando para hoje, eu lidero como Head uma macro-área chamada Value Creation, que engloba os times de Implantação e CS da vertical de imobiliárias da Superlógica.
O detalhe é que até 2022 eu não fazia a menor ideia do que significava Customer Success. E, para ser sincero, até hoje ainda me questiono se entendo completamente. Então, a ideia deste artigo é te explicar um pouco mais do que é Customer Success e como esse conceito se aplica ao seu SaaS.
A relação entre SaaS e CS
O conceito de Customer Success nasceu quase como consequência do SaaS. São histórias que se entrelaçam de tal forma que o livro mais famoso sobre o assunto - que inclusive leva o nome de Customer Success - começa contando a história do SaaS, tanto como forma de desenvolvimento e entrega de software, como modelo de negócio.
O CS nasceu porque, a partir do momento que você deixa de vender licenças de software - recebendo pagamento adiantado por isso - para um modelo de assinatura em que o cliente paga suaves parcelas do seu custo de aquisição ao longo da vida dele extraindo valor do seu software, a importância de se fidelizar um cliente e garantir que ele tenha sucesso utilizando sua solução aumentou de importância de forma exponencial.
Vou deixar aqui dois artigos complementares sobre esse assunto aqui da News, um que explica mais sobre essa história da mudança entre venda de licença para assinaturas e outro que conta mais sobre a importância do LTV (Lifetime Value) em negócios SaaS. Link abaixo:
Foi neste contexto que grandes players do mundo do SaaS, no início dos anos 2000, criaram a metodologia - e diria até filosofia - do Customer Success. E de lá para cá, quase todas as empresas de SaaS um pouco mais estruturadas, contam com uma área de CS. O problema é que muitas delas simplesmente replicaram as práticas dos criadores, sem refletir muito se isso faria sentido em seus próprios contextos.
O que é Customer Success?
CS é a mentalidade ou área responsável por ajudar a garantir que seu cliente obtenha sucesso por meio das suas soluções. Algo importante a se pensar aqui é: o Sucesso do cliente, como o próprio nome diz, é sobre o sucesso DO CLIENTE em primeiro lugar e não necessariamente o do seu SaaS. O resultado gerado para o seu SaaS é uma consequência dos seus investimentos no sucesso do cliente.
Recentemente, fiz um post no LinkedIn que fez bastante sucesso sobre este tema. A ideia é a seguinte:
Aí está a primeira concepção errada. Isso porque, a maioria dos negócios cria uma área de CS pensando primeiro no output (ou nos resultados desejados) em relação a receitas geradas ou redução do churn. Isso faz com que o CS busque o aumento de receita empurrando produtos ou up-sell para os clientes e tente reduzir o churn na base de dificultar o caminho para o cancelamento. CS não é isso.
CS tem muito mais a ver com entender quais eram os resultados esperados pelo seu cliente no momento da aquisição do seu SaaS e como você pode ajudar ele(a) a atingir esses objetivos. Na compra de um SaaS, o cliente geralmente busca:
Ser mais produtivo
Ganhar mais dinheiro
Simplificar sua rotina
Facilitar a execução de tarefas chatas
Não vai muito além disso. Então, o papel do CS é basicamente pensar:
Será que meu cliente alcançou isso? Como será que eu faço com que ele vá ainda além nessa missão?
Para explicar como ele faz isso, existem várias ferramentas e metodologias. Mas essa mentalidade é o cerne de uma área de CS.
A diferença entre o CS e o suporte
Na maioria das empresas, a área de CS acaba se confundindo com o suporte, e isso é bastante perigoso. Afinal de contas, ter times paralelos executando uma mesma função não faz sentido, é ineficiente.
A diferença primordial entre CS e suporte está relacionada à proatividade.
O profissional de CS é focado em prevenção de riscos e problemas. A ideia da área é tentar prever e previnir. Fazendo uma analogia com uma equipe de manutenção de uma indústria, é como se o CS fizesse manutenções preditivas e preventivas, e o suporte fizesse manutenções corretivas.
É claro que eventualmente o CS também entra em ação quando se trata de algumas atividades reativas, como por exemplo:
Realizar um upsell a pedido de um cliente,
Entrar em contato com um cliente detrator em uma pesquisa de NPS,
Tentar reverter um pedido de churn,
Ajudar um cliente que está com muitas dificuldades de suporte, dúvidas ou precisando de treinamento
Entre outras demandas
Mas, a ideia é que essas atividades não componham a maioria do trabalho do CS. Porém, para isso, é fundamental que o profissional de CS saiba:
Endereçar corretamente e rapidamente os problemas
Tenha uma excepcional gestão do tempo
Não postergue problemas e urgências
Seja naturalmente movido a ações mais estratégicas e estruturantes
E é aí que a maioria das áreas de CS se perdem. É difícil atrair, contratar, treinar e gerir adequadamente uma boa área de CS. A facilidade com que essas áreas acabam se tornando um caos é enorme.
O ferramental do CS
Para conseguir ajudar o cliente, uma boa área de CS conta com algumas ferramentas, como:
Planos de sucesso: modelos, templates ou projetos construídos com o cliente logo no primeiro contato de quais são seus objetivos e como o CS o irá ajudar a atingi-los
Segmentação: divisão em grupos da carteira de clientes para definir níveis de prioridade e de contato, de acordo com critérios de relevância
Health score: uma forma qualitativa ou quantitativa - baseada em dados - de medir a “temperatura” ou o risco do cliente
EBR/QBRs (Executive ou Quarterly Business Review): reuniões periódicas marcadas com os clientes para falar sobre os objetivos estratégicos e os andamentos dos planos
Jornada do cliente: um mapeamento da jornada completa do cliente e suas intersecções entre o cliente e a sua empresa, para entender o objetivo de cada momento, como é a percepção média de satisfação com cada etapa e quais são os problemas mais comuns
Playbooks: procedimentos, processos e boas práticas para cada tipo de atividade realizada pelo CS com o cliente
Voice of the Customer (VoC): uma forma estruturada de capturar feedbacks dos clientes e levá-los de forma organizada ao seu time de produto e fazer o caminho de volta da informação.
Pesquisas - como NPS e CSAT: pesquisas de satisfação para capturar a percepção de qualidade na relação com o atendimento, com a sua marca ou com seus produtos.
Existem outras possíveis ferramentas e metodologias, mas as mais comuns são realmente essas.
Os problemas com o conceito de CS
Existe um problema sério que faz com que várias empresas cometam erros graves quando se trata de áreas de CS: a maioria das metodologias de CS foram criadas por empresas Enterprise e que vendem para clientes Enterprise.
O que isso significa? Significa que quando você tem um contrato de 2 milhões de dólares com a Salesforce, faz sentido você ter uma área de CS dedicada completamente ao cliente, afinal de contas a estrutura de custos se paga facilmente, e esse CSM (Customer Success Manager, como é chamado o profissional de CS) conta com uma estrutura que facilita a execução do seu trabalho da melhor forma possível.
Agora, em um negócio com clientes que pagam R$ 200,00 de ticket médio de recorrência (a realidade de maior parte dos SaaS no Brasil), você precisa acumular carteiras de centenas - e às vezes milhares - de clientes com um CSM, tornando inviável uma gestão de qualidade e proximidade como a metodologia pede.
No meu caso, na Superlógica, faz muito sentido. Afinal de contas, temos vários SaaS e produtos com um churn baixo que faz com que o ARPU (Average Revenue per User) do cliente seja elevado e o LTV seja bastante interessante. Mas para SaaS pequenos ou micro-SaaS, vocês deveriam pensar MUITO antes de criar uma área de CS.
Se você tem um SaaS com ARPU abaixo de R$ 1000,00 anuais, nem cogite contratar um CS. E se seu cliente paga menos de R$ 500,00 de recorrência média mensal, evite ao máximo. Seu produto deveria ser bom o suficiente para sustentar uma estrutura autônoma ou de pouco contato com este porte de clientes, principalmente se você tiver um churn elevado.
Uns tempos atrás o Giovanni Salvador, professor da Link School of Business e Founder da Scient publicou no Linkedin dele duas imagens que resumem muito bem isso:
Esta primeira imagem mostra basicamente a relação entre número de clientes do seu negócio por ano e a volumetria de dinheiro movimentado e qual deveria ser o nível de proximidade com o cliente. De acordo com a imagem, se você tem:
Dezenas de clientes e contratos na casa do milhão de dólares anuais, você deveria ter Dedicated Touch, ou seja, 1 equipe ou CSM por conta;
Centenas de clientes que pagam centenas de milhares de dólares anuais, seu contato deveria ser High Touch. Ou seja, carteiras pequenas de clientes com contatos frequentes, personalizados e de qualidade;
Milhares de clientes que pagam em média 50 mil dólares/ano: Mid Touch, ou seja, carteiras grandes de clientes com contatos mais esporádicos;
Dezenas de milhares de clientes pagando até 10, 15 mil dólares por ano: Low Touch, contato em massa, geralmente no formato de conteúdos, webinars e coisas do tipo.
Centenas de milhares de clientes pagando até 5 mil dólares/ano: Tech touch. Ou seja, seus produtos e tecnologias deveriam ser suficientes para manter esses clientes satisfeitos e atendidos.
O segundo post traz o mesmo conceito, detalhados não só para o CS como para o comercial e o marketing. Toda a estratégia da operação precisa responder ao seu modelo de negócio.
Este conteúdo conversa muito com o conteúdo que postei um tempo atrás aqui:
Custos de qualidade
Existe outro conceito que vem da indústria e que poucas pessoas refletem quando se trata de ter ou não uma área de CS: os custos de qualidade e custos de não qualidade.
Quando se trata de qualidade na indústria, tem um gráfico famoso, que é o que está aqui abaixo:
Ele basicamente diz o seguinte: a relação entre custos de qualidade e não qualidade é inversamente proporcional, porém não linear. Não deu para entender nada, eu sei, mas eu vou explicar. Isso quer dizer que:
Quando você tem um baixo patamar de qualidade no seu negócio ou produto, qualquer real investido em qualidade, costuma retornar muito fácil em redução de custos ou perdas. Agora, passado um determinado nível de investimento, essa retorno não volta tão forte, fazendo com que aumentar a qualidade traga prejuízos.
Agora vou exemplificar no mundo de SaaS para facilitar um pouco mais:
Conforme você vai investindo mais e mais na qualidade do seu produto, do seu atendimento e da experiência dos seus clientes, chega um momento em que o ROI disso deixa de ser positivo. A menos que você tenha um retorno positivo sob o seu investimento em contratar pessoas para uma equipe de CS, não faz sentido começar uma.
Por exemplo, se você tem uma carteira de clientes no seu SaaS que rende um MRR de R$ 50.000,00 e você contrate um CSM que custe R$ 4000,00 em custos gerais, é muito difícil justificar esse investimento. Só o CS consome 8% da margem do seu produto, então, a menos que você reduza o churn nessa taxa ou aumente a receita dos seus clientes significativamente por up-sell e cross-sell, não faz sentido.
Conclusão
Então, se você está pensando em estruturar uma área de CS no seu SaaS, reflita muito sobre seu modelo de negócio e se ele comporta algo assim.
Se seu SaaS tem um ticket baixo, vale muito mais a pena investir na qualidade do seu produto e das jornadas autônomas do seu cliente do que iniciar uma área de CS no seu SaaS. O mesmo vale se seu SaaS ainda não for maduro o suficiente para gerar retornos significativos em up-sell, cross-sell ou indicações.
Tome decisões racionais e cresça seu SaaS da forma mais inteligente e escalável possível.